Mofo e Saúde Mental: Como a Umidade Residencial Afeta Nosso Bem-Estar Psicológico

20 de janeiro de 2025

Por Dra. Nelzair Vianna, PhD

Pesquisadora em Saúde Pública da Fiocruz

 

Título do Artigo:
A State-of-the-Science Review of the Effect of Damp- and Mold-Affected Housing on Mental Health

Autores:
Maria Rosa Gatto, Adelle Mansour, Ang Li e Rebecca Bentley
Centre for Health Policy, Melbourne School of Population and Global Health, Faculty of Medicine, Dentistry, and Health Sciences, The University of Melbourne, Parkville, Australia

Fonte:
Environmental Health Perspectives (132(8), Agosto/2024)
Ano de Publicação: 2024

Introdução

A qualidade habitacional desempenha um papel crucial na saúde humana. Embora os impactos físicos do mofo e da umidade, como asma e alergias, sejam amplamente conhecidos, seus efeitos na saúde mental permanecem menos explorados. O estudo publicado na Environmental Health Perspectives analisa essa relação, abordando condições como depressão, ansiedade e estresse emocional, com ênfase nos impactos tanto em adultos quanto em crianças. A pesquisa condensa duas décadas de estudos, destacando mecanismos psicossociais e fisiológicos que explicam esses efeitos.

Metodologia e Análise

Os pesquisadores conduziram uma revisão de 19 estudos publicados entre 2003 e 2023, abrangendo diferentes regiões climáticas e contextos socioeconômicos. A investigação considerou desfechos variados relacionados à saúde mental, como depressão, ansiedade, sintomas emocionais em crianças e estresse pós-traumático após inundações.

A análise foi baseada em dados provenientes de avaliações auto-reportadas, medições ambientais e estudos longitudinais, garantindo um panorama abrangente sobre o impacto da exposição ao mofo e à umidade.

Como o Mofo e a Umidade Afetam a Saúde Mental?

Os resultados revelaram que os impactos são mediadores tanto por fatores psicossociais quanto fisiológicos. Do ponto de vista psicossocial, a insatisfação com o ambiente residencial e a vergonha associada ao estado do lar podem gerar isolamento social e sensações de impotência. Pressões financeiras para reparos também contribuem significativamente para o aumento do estresse.

Fisiologicamente, o mofo pode liberar micotoxinas neurotóxicas que interferem nas funções cerebrais, além de desencadear alterações hormonais, como elevação nos níveis de cortisol (relacionado ao estresse) e redução de serotonina (associada ao humor). Esses efeitos podem ser agravados por processos inflamatórios, que comprometem a cognição e o equilíbrio emocional.

Descobertas do Estudo

Entre os adultos, os moradores de residências com mofo ou umidade apresentaram um aumento significativo nos níveis de depressão e ansiedade. Em um dos estudos revisados, foi identificado que esses indivíduos tinham 39% mais chances de desenvolver depressão em comparação àqueles que viviam em condições habitacionais adequadas. Custos financeiros elevados e a sensação de falta de controle sobre a manutenção do lar foram apontados como agravantes.

No caso das crianças, os efeitos emocionais foram ainda mais evidentes. Crianças expostas a ambientes úmidos ou com mofo apresentaram um risco 40% maior de desenvolver desregulação emocional e dificuldades comportamentais. Esses sintomas foram atribuídos tanto ao impacto fisiológico quanto ao ambiente familiar conturbado causado pelas condições habitacionais.

Casas afetadas por inundações, onde a concentração de mofo tende a ser mais elevada, apresentaram altas taxas de estresse pós-traumático e ansiedade entre os residentes. Segundo os dados analisados, o risco de desenvolver transtornos de estresse foi 1,5 vez maior em lares com alta concentração de mofo após inundação.

Desafios e Perspectivas Futuras

Apesar das descobertas significativas, o estudo identificou limitações que precisam ser abordadas em pesquisas futuras. A maioria dos estudos revisados foi realizada na Europa e na América do Norte, deixando regiões como América Latina e África sub-representadas. Além disso, a dependência de autorrelatos pode introduzir vieses, e a causalidade entre saúde mental e condições habitacionais ainda requer investigações mais robustas.

Os autores sugerem o uso de ferramentas mais objetivas, como biomarcadores inflamatórios e exames de imagem cerebral, além de ampliar as pesquisas em populações diversas. Essas iniciativas poderiam fornecer uma compreensão mais profunda sobre a relação entre habitação e saúde mental.

Conclusão e Relevância

Este estudo sublinha a importância de considerar os impactos do mofo e da umidade além da saúde física. Os efeitos na saúde mental são significativos e exigem ações abrangentes para mitigar seus impactos. Intervenções profissionais de remediação e manutenção preventiva devem ser priorizadas. Além disso, é essencial implementar políticas habitacionais que garantam condições de vida seguras e saudáveis, combinando essas medidas com suporte psicológico para populações vulneráveis.

 

 

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